Tudo começou em agosto de 2017, com a Resolução 685. Ela muda a redação de alguns pontos da Resolução 168/2004. Nos pontos 6.1 e 6.2 a redação mudou de “no mínimo categoria D” para “estar habilitado na categoria D”.
Essa pequena mudança significa muito. Com isso, o que muitos entendem é que quem está habilitado na categoria E e não passou pela categoria D – ou seja, pulou da categoria C direto para a E – não pode mais fazer o curso.
Ao questionar o órgão, a resposta que recebemos foi:
“Se o condutor categoria E tiver realizado o curso para categoria D, ele poderá se matricular no curso especializado para condutores de veículos de transporte de passageiros. Caso contrário, não poderá.”
Ou seja, mesmo quem já tem o curso, não pode sequer renová-lo. (veja aqui matéria no Pé na Estrada sobre o assunto)
Contradições
Muita gente achou absurdo. Nós entendemos por contraditório. Afinal, não se proibiu que os motoristas dirijam os veículos, então se ele pode dirigir, por que não pode fazer cursos para eles?
Outra questão é que, segundo o Detran, para dirigir alguns tipos de ônibus, como os articulados com mais de 6 toneladas depois do primeiro módulo, é necessário ter CNH E. Se a exigência é a categoria E, como o motorista que tem essa habilitação não pode fazer o curso?
A princípio vimos outra contradição, já que quando você muda de categoria, a prova é apenas prática. Não existe exercício teórico, você não aprende as diferenças entre levar pessoas ou carga em seu veículo. E se você tem habilidade para dirigir uma carreta ou bi-trem, como não teria para dirigir um ônibus? Mas agora o motivo da mudança está ficando mais claro.
Nova CNH
No dia 8 de dezembro, o Contran soltou a Resolução 718/2017, o objetivo do documento é regulamentar as especificações da nova CNH, e foi com a foto do modelo da nova habilitação que começamos a entender as mudanças do Contran.
Percebe-se, no verso, uma quantidade grande de categorias. O que indica uma mudança na forma de tirar as habilitações. A partir de 2019, quando deve entrar em vigor o novo modelo (leia matéria sobre a nova CNH aqui), será clara a distinção entre habilitação para cargas e passageiros. Também será mais gradual a permissão para dirigir veículos maiores. Por exemplo, hoje a carteira C já dá direito a dirigir caminhões toco e trucado, mas, ao que tudo indica, no futuro cada um terá sua própria categoria.
O caminhoneiro brasileiro Ricardo Faceira, que hoje roda na Europa, nos contou, em uma de nossas lives no Facebook, que o novo modelo se assemelha ao praticado na União Europeia.
A semelhança nos indica que a Europa pode ter sido a inspiração para a mudança. Veja abaixo a classificação geral na UE (existem pequenas variações por país). Não quer dizer que a nossa será exatamente assim, mas deve ser bem próxima.
Categoria | Descrição | Idade mínima | Pré-requisitos |
AM | Veículos de duas ou três rodas com velocidade máxima de 45km/h e cilindrada máxima de 50cm3 | Entre 14 e 16 anos dependendo do país | |
A1 | Veículos de duas rodas com até 125 cilindradas e motor de até 11kW e tricíclos com motor de até 15kW | 16 anos (17 e 18 em alguns países) | |
A2 | Ciclomotores com motor de até 35kW e tricíclos com motor de até 15kW | 18 anos (19 no Reino Unido e 20 na Dinamarca, Grécia e Holanda) | |
A | Qualquer ciclomotor ou triciclo não presente nas categorias A1 e A2 | 20 anos, mas pode variar e em alguns países chega a 25 | |
B | Autoveículos com até 3.500kg e até 8 passageiros + motorista. Pode ser combinado com implemento de até 750kg. | 18 anos (em alguns países aos 17 com supervisão de um maior de 18) | |
BE | Autoveículo da categoria B + implemento de até 3.500kg | 18 anos | B |
B1 | Quadricíclos pesados | 16 anos (exceto pela Suíça, onde são 18 anos) | |
C1 | Veículos grandes de carga com PBT máximo de 7,5t, com ou sem implemento de até 750 kg | 18 anos | B |
C1E | Combinação de cavalo mecânico categoria C + implemento acima de 750kg | 18 anos | C ou C1 |
C | Veículos grandes de carga com mais de 3,5t e não mais de 8 passageiros + implemento de até 750kg | 21 anos (18 anos em alguns países) | B por um ano não incluindo permissão |
CE | Outras combinações com implemento de mais de 750kg | 21 anos | C |
D1 | Ônibus leves com máximo de 16 passageiros + motorista e comprimento máximo de 8 metros | 21 anos | B por um ano não incluindo permissão |
D1E | Combinação de veículos onde o dianteiro é categoria D1 e o de trás tenha peso máximo de 750kg | 21 anos | D ou D1 |
D | Veículos para mais de 8 passageiros | 24 anos | B por 2 anos não incluindo permissão |
DE | Combinação de veículos onde o dianteiro é categoria D e o implemento tenha mais de 750kg | 24 anos | D |
E o custo dessa nova CNH?
Disso ninguém tem a menor ideia. Aparentemente não haverá alteração. Até porque, pelas imagens liberadas pelo Contran, nem as categorias ainda devem estar definidas, já que as ilustrações representam veículos típicos europeus, como implementos de 2 eixos, e não a realidade dos brasileiros, com seus bitrens e rodotrens.
Ok, mas eu posso ou não fazer o curso de passageiros com a CNH E?
Essa pergunta parece fácil, mas não é. Depois de muito barulho por conta da questão, alguns motoristas começaram a informar que estavam conseguindo fazer o curso. Conseguimos falar no Sest Senat Fernão Dias, que afirmou estar sim ministrando o curso. Com isso perguntamos ao Contran se estava enfim liberado. A resposta foi:
O Sistema RENACH está sendo ajustado para atender às necessidades estabelecidas pela Resolução 685/17.
Em relação à perguntas feitas, não houve qualquer mudança promovida pelo DENATRAN desde a publicação. No entanto, cabe destacar que cada DETRAN tem autonomia, dentro da sua circunscrição, para estabelecer critérios.
Portanto, para que haja pleno esclarecimento sobre o assunto, é importante que seja feita a verificação junto ao DETRAN no qual esteja o prontuário de CNH do condutor.
Não fica clara que mudanças são essas no Renach, mas se antes a resposta era um NÃO categórico, agora o órgão dá liberdade ao Detran. Porém, os Detrans de São Paulo e Bahia responderam afirmando que não liberaram o curso de passageiros para quem não passou pela CNH D. Já os Detran do Rio de Janeiros, Minas Gerais, Paraná e Rio Grande do Sul afirmaram estar tudo permitido. Em todos eles o MOPP está liberado para quem tem CNH D mesmo que não tenha passado pela C
Perguntamos também ao Sest Senat como algumas unidades estão conseguindo aplicar o curso, mas ainda estamos esperando uma resposta oficial.
E qual o sentido de tudo isso?
Reunindo todas as informações acima, entendemos que a Resolução 685 do Contran já começa a preparar o terreno para as mudanças que devem chegar em 2019, quando cada categoria poderá ser bem separada. Provavelmente ficará claro que categoria C é carga carga e D para passageiros, sendo a E apenas uma adição às demais, específica para implementos.
O Ministério das Cidades nega possíveis mudanças, segundo resposta enviada ao Pé na Estrada:
Não haverão mudanças nas categorias existentes no Brasil. As várias categorias que aparecem no verso da CNH, tem por finalidade adequar o modelo Brasileiro ao padrão internacional.
Porém eles mesmos já se posicionaram quanto a uma mudança na forma de habilitar motoristas no País, então não temos tanta certeza dessa negativa. E a mudança, como já falamos, não seria ruim, o problema é que o órgão já mudou regras muito antes da nova medida entrar em vigor e de uma hora para a outra, sem dar explicações, sem dar alternativas ou tempo de resposta para os motoristas que já estão no mercado e que, de repente, correm risco de perder seus empregos pois são classificados pelo órgão como “não aptos” a exercer um trabalho que já fazem há anos.
Isso mostra que mais uma vez no Brasil o problema não está no conteúdo; afinal, precisamos mesmo de novas regras para quem está se habilitando, é necessário realmente melhorar a qualidade do novo motorista; mas na forma, sempre atrapalhada e sem pensar nas consequências imediatas para os cidadãos.
Caso queira entrar em contato direto com o Contran para críticas ou sugestões, o e-mail deles é: denatran@cidades.gov.br
Por Paula Toco
Jornalista especializada em transporte comercial há mais de 15 anos.
Repórter do programa Pé na Estrada na TV (hoje no SBT) e coapresentadora do programa no Rádio (hoje na Massa FM). Mais de 300 mil seguidores nas redes sociais (Instagram + Tik Tok) onde fala de segurança e legislação de trânsito. Autora do livro “E se eles sumirem?” e palestrante de segurança no trânsito.
Não seria mais prático e claro para todos condutores já existentes, manter as categorias existentes e adicionar a categoria anterior
Exemplo E + D ou D + E categoria máxima, todos veículos de B a E
Exemplo C + D truques e passageiros
Exemplo B + C toco e veículos até 8 lugares
No exemplo B1 CNH definitiva e B permissão