A mais recente Pesquisa CNT de Rodovias, divulgada em 2022, apontou uma piora considerável na qualidade das rodovias federais e estaduais em um período de doze meses.
Chama a atenção no levantamento a queda na avaliação das pistas administradas pela iniciativa privada, visto o alto preço de pedágio cobrado em algumas praças. Já em relação às vias públicas, o que já era ruim, acabou piorando mais.
Com os números em mãos, questionamos condutores e autoridades a fim de sanar a seguinte questão: Como explicar a piora na qualidade das rodovias brasileiras em 2022? O que será feito daqui pra frente para melhorar a malha rodoviária brasileira?
Resultados da Pesquisa
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Rodovias Concessionadas
Em relação às rodovias concessionadas, foram avaliados 23.238 quilômetros de pistas em todo território nacional. Os números apontam queda nas avaliações positivas do estado geral das rodovias, totalizando uma baixa de 5,2% na soma de Ótimo e Bom.
Em contrapartida, outros 31,0% desta extensão foram classificados como Regular, Ruim ou Péssimo, percentual equivalente a cerca de um terço (7.197 quilômetros) da extensão das rodovias sob concessão.
Nós conversamos com condutores pelo trecho e, segundo eles, há diversos problemas em rodovias concessionadas. Os estradeiros Erico (QRA: Negão), Emerson (QRA: Cabeça Ruim) e Carlos Eduardo (QRA: Carlão), que trabalham com transporte de cimento, afirmaram que as melhores vias pra rodar estão em São Paulo. Em outros estados, a situação não é boa:
“Depende do lugar que você roda. No estado de São Paulo tem as melhores, agora você vai chegando em Minas tem muita estrada ruim, no Espírito Santo também. O melhor mesmo é em São Paulo, o resto é bem complicado […] “A ViaBahia agora que tá tendo pedágio melhorou bem, só que a terceira faixa que tem é duas (risos). Não é nem uma terceira faixa, é só um pedaço. Em Divisa Alegre só tem duas ‘terceiras faixas’ em 500 quilômetros.”
Uma rodovia citada pelos condutores foi a Fernão Dias, que é concessionada, mas apresenta diversos problemas como por exemplo, a condição irregular do pavimento em diversos trechos.
“Estrada ruim que você paga pedágio pra andar é a Fernão Dias. A Fernão é a mesma coisa que você rodar em estrada de chão, você vem ‘socando’ de lá até aqui. É buraco, é trepidação. O acostamento também é muito ruim. A Fernão, de 2021 pra 2022, com certeza piorou […] É uma rodovia pedagiada, eles tinham que arrumar pra gente. Olha o fluxo de caminhões que tem ali 24 horas por dia. Não é possível que não sobra dinheiro (para reformas na via)”, afirmou o caminhoneiro Erico.
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Rodovias públicas
Em relação às vias administradas pelos órgãos públicos, o que já era ruim, piorou. De acordo com a CNT, 75,3% da extensão, cerca de 65.566 quilômetros de vias, apresentam algum tipo de problema em seu estado geral.
Apenas 24,7% das rodovias públicas apresentam boas condições em relação a Pavimento, Sinalização e Geometria da Via, segundo a pesquisa.
Os estradeiros com quem nossa equipe conversou não pouparam críticas às atuais condições das rodovias públicas em que eles rodam frequentemente. O condutor Lucas Siqueira Mota (QRA: Lukinhas) nos relatou qual foi a pior rodovia em que ele já passou e qual o principal problema do trecho:
“A pior rodovia que andei foi ali no Mato Grosso do Sul (MS-134 e MS-480), na divisa com Rosana (SP), por ali. É um pedacinho ruim, pedacinho feio. O problema ali é o asfalto, a estrada é estreita e o piso é muito ruim.”
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Mais gastos com acidentes, menos investimentos em obras
É histórico no Brasil que o custo dos acidentes superarem o valor investido em infraestrutura rodoviária, realidade que poderia ser evitada com a melhora da pavimentação, da sinalização e da geometria das rodovias.
Segundo a CNT, até agosto de 2022, estima-se que os custos dos acidentes tenham sido de R$ 8,29 bilhões, enquanto o total pago em investimentos em rodovias federais foi de R$ 3,90 bilhões, resultando em uma diferença de R$ 4,69 bilhões.
A pesquisa também identificou que apenas 8,9% de pistas (9.770 quilômetros) encontram-se com a condição de superfície do pavimento classificada como em perfeito estado. O restante, 91,1% (100.562 quilômetros), possui algum tipo de defeito.
O pavimento das vias é um dos grandes motivos de queixas dos condutores que encontramos no trecho. O caminhoneiro Erico, destacou quais foram as rodovias com problemas de asfalto que ele passou recentemente:
“A 265 (Que liga a Fernão a 040) precisa de reforma, já que aumentou o fluxo de caminhões devido a expansão da fábrica de cimento. É muita carreta, é acidente todo dia, falta uma terceira faixa na pista. A situação tá precária, principalmente ali no trecho entre Lavras e Itutinga […] Também tem muita estrada ruim na região Nordeste, no estado do Mato Grosso. A pior estrada em que passamos é até difícil falar. A 163, arrumaram ela, mas ainda tem muito lugar ruim, é a pior. Outra ruim é a 262, entre BH e Manhuaçu, que tá precária demais.”
A CNT afirma que para solucionar esses problemas e garantir a manutenção das vias, seriam necessários aproximadamente R$ 94,93 bilhões. Deste montante, R$ 72,26 bilhões iriam para a reconstrução e restauração dos trechos que se encontram com o pavimento com trincas em malha, remendos, afundamento, ondulações, buracos ou que esteja destruído.
Os outros R$ 22,67 bilhões seriam necessários para garantir a manutenção das vias classificadas como desgastadas, garantindo que as deficiências não evoluam e, assim, exijam investimentos ainda mais robustos.
O caminhoneiro Daniel Gonsalves Rodrigues (QRA: Danielzinho), que corta as estradas transportando cargas variadas e não perecíveis, falou sobre a importância de se investir mais e melhor nas rodovias e estradas federais e ressaltou a necessidade de mais pontos de parada no trecho:
“Mais investimento em tecnologia é importante. E pelo fato de que com essas autorizações recentes que os caminhões possam transportar mais pesos é necessário sim um investimento maior em Rodovias no Brasil […] A Falta de ponto de parada também é um grande problema pra gente. Passamos sono atrás do volante porque não encontramos ponto de apoio.”
O que pensam os órgãos responsáveis pelas operações das rodovias?
Com as constatações da Pesquisa e as reclamações dos estradeiros, questionamos as associações e os órgãos responsáveis pela administração das rodovias concessionadas e públicas do país para responder o porquê desse aumento na piora da qualidade das pistas.
A ANTT, Agência Nacional dos Transportes Terrestres afirma que “Para garantir a qualidade das rodovias concedidas, a Agência mantém monitoramento constante das concessões, quando observadas inconformidades ao contrato, as Concessionárias são acionadas para solucionar as adversidades para manter a fluidez do trânsito e segurança de quem circula pela via.”
O DNIT nos respondeu, afirmando que “monitora mensalmente a malha rodoviária sob sua jurisdição e trabalha para garantir o melhor nível de serviço.” Além disso, o órgão destaca que atingiu o patamar de 96% da malha rodoviária federal coberta por contratos de manutenção e entregou 4 mil quilômetros de revitalização, pavimentação e duplicação de rodovias no país.
O Ministério da Infraestrutura destaca que “Mesmo em um cenário de restrição orçamentária, foi possível revitalizar, reconstruir, renovar e duplicar cerca de 6,5 mil quilômetros de estradas.” O MInfra ainda enfatizou alguns pontos a serem repensados para uma melhor condição das estradas no país, como a retomada de obras paradas por faltas de recursos, novas análises de contratos dos 15 mil quilômetros de rodovias concedidas e a ampliação da participação do setor privado. Essas estão entre as prioridades destacadas pelo novo ministro dos Transportes, Renan Filho.
Já a ABCR, Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias, destacou que “22 das 25 melhores rodovias do país, segundo a CNT, são concessionadas”. Além disso, a organização nós apresentou pontos como o funcionamento de 4,7 mil câmeras 24 horas por dia em mais de 25 mil quilômetros de pistas, ligadas a Centros de Controle Operacionais, de onde são coordenados os chamados e os atendimentos mecânicos e médicos de urgência, que somam mais de 5 mil por dia, em média. Ao questionarmos as reclamações de condutores em relação a qualidade de asfalto e preços de pedágios em rodovias concessionadas, a ABCR não quis entrar em detalhes.
Em relação as condições da Fernão Dias, rodovia citada por alguns caminhoneiros com quem conversamos pelo trecho, a concessionária Arteris, responsável pela administração da via, informa que: “os investimentos em obras e conservação na BR-381 seguem sendo realizados periodicamente na rodovia”. Ainda em nota, a concessionária afirma que: “Nos últimos 15 anos, foram mais de R$ 2,8 bilhões aplicados em infraestrutura, o que inclui os serviços de conservação e manutenção do pavimento e a instalação de sinalização de acordo com os padrões do contrato firmado com o Poder Concedente (Poder Público)”. A Arteris encerra destacando que aumentou o número de equipes nas operações de reparos nos últimos meses e que o período chuvoso impacta os trabalhos de manutenção definitiva, que serão intensificados no período de estiagem.
De quem cobrar melhores condições no trecho?
No ano passado, destacamos em uma matéria especial sobre problemas gerados por buracos, a quem os motoristas devem recorrer caso passem por esse e outros problemas gerados pela má qualidade das vias. Vale destacar que o condutor pode e deve cobrar atitudes pontuais para a melhoria das condições de estradas, de órgãos responsáveis pela fiscalização e obras nas pistas:
- Rodovia Estadual não concessionada: DER (Departamento de Estradas de Rodagem);
- Rodovia Municipal: Secretaria de Transportes do município em questão;
- Rodovia Federal: DNIT ou ANTT.
No caso de problemas em rodovias concessionadas, o estradeiro pode e deve entrar em contato com a empresa responsável pela manutenção e gestão do trecho, para fazer o seu alerta ou reclamação.
Por Daniel Santana com informações da Pesquisa CNT de Rodovias 2022